Sobre amanheceres
Sentou-se à varanda de sua casa, sorveu o primeiro gole de café e, respirando fundo, saboreando aquela prece líquida, acendeu seu cigarro e permitiu que sua mente viajasse por um momento. Sua paz não permanecera muito tempo ali, já que morava frente a uma rua movimentada, onde o ir e vir de automóveis tirava-lhe o sossego a todo instante.
Apesar de seu olhar brilhar de alegria e seu peito ainda escondia um medo enorme do que estaria por vir, respirava fundo a cada gole de café, repetindo a si mesmo: “confiança”. Estranhamente veio a sua mente a reflexão onde enumerava as diferenças entre fé e crença. Por um breve instante, sentiu-se tonto em meio à tudo que está ocorrendo na vida. Mudança de endereço, novos aprendizados, o início de uma faculdade depois de tantos anos sem estudar, a ansiedade vai e vem, trazendo consigo uma enxurrada de sentimentos, faltou-lhe o ar. Segurou firme na mesa ao seu lado e deu mais uma tragada.
Coragem! Repetia constantemente. Cerrou os olhos e lembrou das meditações que introduziu aos seus hábitos matinais. Logo sua mente o fez recordar o aroma dos incensos que acendia vez ou outra. Mais calmo, levantou-se e foi buscar mais café. Novamente em sua cadeira, pensou em chorar. Ao invés disso, acendeu outro cigarro, disfarçou um sorriso e soube que somente a fé poderia guiar seus dias vindouros.
Não poderia entregar sua esperança ao medo. O medo nos faz colecionar frustrações. Não que, cheios de confiança, não tropecemos, mas o medo nos congela, nos faz desistir da tentativa. E não sabemos se dará certo, se não tentarmos. Nossa vida será sempre uma coleção de erros e acertos, faz parte da construção de quem somos. E o que fazemos com as consequências é que nos deixam mais experientes antes de dar o próximo passo ou fazer a próxima escolha.
Naqueles minutos em que parou o seu pensamento, ficou óbvio que só havia um inimigo à sua frente. O fracasso? O medo? A frustração? Longe disso.
O cansaço estava apenas em sua mente. Há um caminho longo a percorrer. É preciso acreditar. Apesar de detestar autoajuda, eram frases desse tipo que ganhavam volume nos ecos dentro de sua cabeça. Claramente torcia o nariz para esses ecos, pois sempre foi fá de reflexões mais profundas do que essas orações rasas que revelavam apenas o bom senso, nada mais.
Na tentativa de diminuir tamanho estardalhaço em sua cabeça, pegou seu celular e colocou numa playlist qualquer de jazz, ao menos, os automóveis que passavam pela rua já não lhe chamavam mais a atenção.
Entre um cigarro e outro, um gole de café. E o grande terror apequenou-se diante de si. Mais confiante, decidiu começar os seus afazeres. Contava os dias para que a visão daqueles cômodos mudassem. O ambiente ali era triste, o desencorajava. Todavia, era necessário prosseguir. Falta pouco.
“Acalme-se Roger, acalme-se”.
Depois desse amanhecer quase necessário para si, abriu o seu notebook, viu a tela em branco exigindo-lhe palavras e ali, deitou suas ideias sem impor roteiro algum.